Já faz um tempo que venho observando o comportamento das pessoas. Gosto de fazer isso, pois é interessante ver como alguém se porta quando está falando com você e quando está quieto, absorvendo o que se passa. O entusiasmo que chegam para lhe dar uma notícia boa e o pessimismo que carrega a notícia ruim. Gestos, expressões, o corpo, tudo isso nos diz muita coisa. Basta prestar atenção nos detalhes que circulam os seres para entender as emoções.
Essas sensações que temos ao encontrar pessoas e consequentemente, observar seus sentimentos é interessante. A ciência explica isso de uma forma, digamos, quadrada e sendo assim, prefiro colocar aqui o lado místico, que desenvolveu a “teoria da aura humana”.
Leia a teoria a aura humana aqui Em uma explicação mais elaborada sobre esse assunto, temos: “A aura é um campo energético que envolve o nosso corpo físico e nos dá toda sua leitura emocional. Nossos medos, nossas angústias, nossas raivas, tudo aquilo que se diz a respeito a emoção.”
Eu costumava não dar muita atenção para esses assuntos, era bem cético. Até ver que é mais comum do que imaginava, não somente por coincidências, em qualquer âmbito. Mas o que isso tem a ver com skate? Bom, algum tempo atrás estava olhando o Instagram e vi algo que me chamou a atenção. O Fabio (Cristiano) postou um trecho do vídeo “cherry” da Supreme (vídeo de skate lançado recentemente) e em um dos comentários o (Flavio) Samelo disse: “Se alguém tivesse feito um vídeo desse no Brasil, seria crucificado!”. Será que seria? Porque seria? Bom vamos chamar essa situação de:
A “Aura dos vídeos”. Vídeos estão em “alta” no skate, se é que me entendem. O preço das câmeras? Está mais acessível. Para achar as câmeras? Se você mora em São Paulo vá na Santa Ifigênia, acesse o Mercado Livre, eBay de qualquer lugar. Aliás, você tem computador? E o software? Muitos já possuem computador em casa e é possível baixar quase tudo via “torrent”. Faça essas perguntas nos anos 90 aqui no Brasil, veremos a diferença e talvez o porque dessa crucificação de alguém fazer um vídeo com determinado conceito pelas bandas de cá.
O gap formado entre a realidade brasileira de vídeos de skate e os EUA foi gigante. Minha geração ficou marcada pelas 411VM, Yeah Right, DC Video, Sorry e etc. Fomos expostos a essas referências por muito tempo e naturalmente, nossa opinião crítica vinha a partir disso. Quer saber se algo é bom? Compara com as tais referências. Isso é muito injusto devido a situação econômica e social que tivemos e ainda temos em nosso país.
Só agora o público começa a entender os reais processos que dizem respeito a elaboração de um vídeo, como tempo de produção, esforço investido e busca por referências. Temos novos talentos como o Gui Guimarães da Vibe e Eric Veloso que trabalha aqui conosco, eles são formados em cinema e estão produzindo vídeos de qualidade. Temos também o Renato Zokreta que acabou de lançar um vídeo épico pela Agacê Skateboards, com uma trilha totalmente nacional e ainda eu tive de ouvir comentários do tipo: Legal, mas é bem Alien Workshop né?
Agora entendem o ponto de vista que quero trazer neste texto?
Vamos buscar referências aqui, pois até os próprios gringos já estão de saco cheio do que vem sendo feito por lá. Ai vão umas dicas que a Jenkem Mag fez, a matéria está em inglês,
clique aqui para verA “Aura do estilo”Calça na canela, calça larga, calça colada. Camisa ou camiseta? Você escuta Punk, Reggae, ou Rap? Aprecia arte e música clássica? Ou gosta mesmo de tomar cerveja, usar bermudão e meia alta pra andar SÓ em bowls e cuspir em criancinhas que te atrapalhem?
O skate possui grupos e isso é claro. O problema é ver gente limitada por conta disso, ver que o que aquele cara está fazendo não é natural. E o que é mais bonito de se ver no skate é justamente a naturalidade e fluidez nas manobras.
Adoro emprestar meu skate para uma criança (tá não é sempre, tem umas que enchem o saco) e ver o que ela vai fazer, pois hoje tudo está muito previsível. Não sei se a idade está me trazendo isso ou as coisas realmente estão “enlatadas”. Quem ai viu a parte do Gou Miyagi no vídeo da Heroin? Ou quem se atreveria a chegar na Praça Roosevelt com esse “estilo” de andar:
Acho que tudo remete ao que eu disse uns parágrafos acima: A quantidade de referências americanas a que fomos expostos durante esses anos. Imagine como seria o estilo das pessoas andarem aqui? As roupas que usariam? Músicas? Será que teríamos algo embasado em cinema novo, tropicália, barroco e rococó ou nas músicas de Michel Teló, na arte de Romero Britto e filmes produzidos pela emissora Globo TV? Confesso que fiquei curioso agora.
Criativos do skate nacional! Estão esperando o que para libertarem-se dessa “aura de estilo” e acabar com nossa curiosidade?
A “Aura do skatista”O que é ser um skatista? Significa dar manobras, andar todo dia e “viver na rua”? Significa ter caráter? Significa diversão ou trabalho? Me lembro muito bem de uma discussão que aconteceu em uma demo que fizemos. No meio de todo o alvoroço, o cara com quem eu falava, me disse: “Bom. Skatista eu sei que sou mais do que você!”.
Penso nisso sempre, e me vem uma série de coisas na cabeça. Andar de skate tornou-se uma ferramenta para você ser “mais” que outras pessoas?
Muitos levam a sério esse estilo americano de “Skate and Destroy”, atravessando os limites da humanidade e caráter, pensando que o simples fato de saber dar um “backside tail” lhe dá super poderes, que são: Subestimar a capacidade alheia, obter muito ego, não ser grato pelos favores que lhe fazem e muito menos retribui-los.
Conheço muitos “skatistas” que nunca pisaram em um skate, mas fazem comida e arrumam a bagunça quando seus filhos trazem os amigos já bem grandinhos para ficar por mais de uma semana em suas casas. Conheço “skatistas” que nunca pisaram em um skate, mas dirigem por mais de 8h para que seus irmãos possam se divertir em outra cidade. Conheço skatistas que servem suco e água para um estranho que foi “destruir” a borda do seu estabelecimento.
Portanto, não se iludam, SKATE é uma atividade que deixa transparecer o caráter das pessoas, o modo como lidam com suas adversidades, alegrias e incertezas. Assim como outros ofícios também o fazem, cada um da sua forma. O que importa mesmo é respeitar, ter humildade de verdade a fim de se reinventar.
Os brasileiros já fizeram isso nos anos 1960 com revoluções na arte e na música. Fizeram por que se permitiram sentir e isso é o essencial para qualquer vídeo, estilo e skatista. Como dizia Hermeto Pascoal: “O sentir vem antes do saber”.
Ilustrações:
Alexandre Veloso